segunda-feira, 27 de maio de 2013

Quanticamente

Retoca o brilho da função
que se expande até o infinito
em azul transcendentalmente translúcido
que se normaliza num verde inconstante em teus olhos.
Generalize tua fala de mentira
em ilusões contínuas e indiscretas
como uma partícula livre,
nas condições de contorno da tua boca.

Calo o desejo em um valor
apenas esperado
confinado numa região classicamente proibida
sob a ação do potencial atrativo
de tua voz bem-comportada.

E, no espaço dos momenta,
enquanto disperso em coordenadas,
tua hermética pele hermitiana
reintegra a face imaginária que não te define
por não teres conjugado.

Degeneradas são as formas dos meus estados,
incomutáveis são os nossos operadores.
Estacionariamente fico submetida
a uma descontinuidade derivada da incerteza.

Permaneço no fundo de um poço potencial,
com resultados específicos para energia,
e me disfarço em barreira
sem possibilidades de tunelamento.

Porque tudo em você explode na expectativa,
porque onde nos tocarmos
não haverá mais solução.


Clarice Shaw

domingo, 26 de maio de 2013

Vãos do Ocaso

Tu vens
nuvem
fugidia do dia
no arco da íris
em teus olhos
sobre os meus invernos
de gelo, inverso
ao verso.
Avesso.

Você chove.
Eu reverto e deserto,
deserta.

Você trovão
e tempestades
e raios que me partem
e eu parto
para além.
Você aquém
da primavera
das cores
que não brotam flores
se fores
de ocaso.
Descaso.

Se põe
e se opõe
a mim.

Clarice Shaw

sábado, 25 de maio de 2013

Anos-Luz

teus olhos
meus olhos
mais perto
espectro
eletromagnetizado

teu corpo
momento
instante
aberto
por dentro
inteiro
completeza
sem cessar

o sol
difuso
ardendo
infinitos
tua pele
clara
reflexiva
potencial

longe demais

tua voz
perdida
no tempo
no espaço
vazio
em espera
na noite
silente
deserta
escura...

não se dissipe

não se dissipe


Clarice Shaw

(Re)Partida

Parto em pranto
sem espanto.

Separo, paro,
prossigo: consigo!

Parto: entretanto
sem encanto.

Agonizam-se as vidas
que vão morrendo dentro de mim,
uma a uma.

Estou presente,
sou ausente...
acidente:
sou nenhuma!

Parto entre tantos
desencontros...

Errar novos erros,
descobrir novos desejos,
defender novos defeitos!

Parto em pranto
e portanto

sou pedaço,
sou de aço,
(desata-se o laço -
o que eu faço?).

De mundo em mundo
vou mudando!

Sentido

camisas de vênus
em eunucos barrocos

anéis de saturno
sob os olhos fechados

auroras nascentes
de ocasos sangrentos

distância infinita
de eclipse claro

flores mortas serenas
sobre velhos defuntos

mãos cegas despertas
tocando sussurros

cores frágeis em lua
de sorriso mudo

algodão insone caído
no céu noturno

cantiga de ninar
em quem não anoitece

dorme, menino,
teu carinho é uma prece

a realidade
é um sonho comprido...

a vida inteira
não é mais que um suspiro.


Clarice Shaw

domingo, 19 de maio de 2013

Mecanicidade

Por trás da prisão sem muros dos dias
reflito a fugacidade
sob o céu nublado.

A eternidade é apenas um passo
além de mim.

Sou resultado de tudo o que se foi
e encarcerei a minha alma
em cada um dos meus desejos.

Tudo termina
dentro de um novo início
e o futuro é o passado esquecido
que se repete
sem conhecermos como ocorrido.

Adormeço a mesma noite
que me sorriu todas as mortes.

As luzes se calam dentro das trevas
que me propus.

Só o silêncio me conduzirá de volta.


Clarice Shaw

sábado, 18 de maio de 2013

Perigeu




O crepúsculo é um precipício
em que o sol se lança
e depois do sangue
a lua, em luto
estende sobre o mar seu manto de constelações.

Por trás das palmeiras vai chorar
sua face iluminada
e com seu brilho-encanto
apaga outros que reluzem pelo infinito.

É gigante que clama pelas águas
e as águas todas levantam-se ao seu encontro,
e aqueles que são feitos de oceano,
ao pressentir sua plenitude,
em luar devotos,
entregam-se à loucura.

Clarice Shaw

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Lemingue

Há precipícios
em teus olhos de lemingue.
Não se precipite.

Há precipícios.
Em teus olhos se lê. Mingue.
Não se precipite.

A jornada é cega,
a morte é certa.

A jornada é insana,
teus olhos insones...

Não se precipite
no precipício,
no salto de dentro dos teus olhos,
lemingue. Mingue seu fim.


Clarice Shaw

quinta-feira, 16 de maio de 2013

A Cura


Caia dentro de mim
e se entorpeça.

Deixe o flagelo de tuas asas
entre o desejo e o prazer
antes que os dois se confundam.

Deixe comigo a sua dor.

Eu sinto os teus sentidos
vagando erroneamente...

Arranque teus olhos
e tua língua.
Arranque tua pele coberta
de outros corpos.

Deixe tudo o que estiver corrompido
entre os meus dedos.

Arranque teu sexo
e teus instintos
e se abisme nos meus abismos.

Deixe teu sangue correr
pela tua alma quebradiça.
Deixe teus limites se despedaçarem
em minhas mãos.


Clarice Shaw

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Que não caia o mastro

Há quantos passos estou de nós?
Por quantas vidas se desfazem os nós?
Se atariam mais num desatino
Desatariam mais neste destino?

A quem os passos eu sempre sigo
Sem saber, cega, eu não desisto?
Será da terra dos arianos,
O mais ferrenho pagão?
Será um doce lobo da estepe
Entre suas vis plantações?
Ou o mais negro dos lobos
Do mais celeste olhar?
Seria alguém ainda por vir
Ou simplesmente ninguém será?

Enquanto convidam à dança
Brincam, serelepes, como crianças
Doces ilusões
Pobres átrios atrofiados
Nunca fazem-se de rogados
Ao menor aluvião

Que venham em polvorosa, malucas
Mas venham sempre desnudas
As mais loucas sensações

Que venham, apesar do compasso
Entre outras harmonias, enlaços
Enquanto possuir o mastro
Serei mais faceira que ti, paixão.

Nirvana


Não corte meu corpo impuro,
não recorte todos os pedaços
que aprenderam a apodrecer em silêncio.

Nada desperta
depois que a alma se corrompe
e se fragmenta em diversos demônios.

Destrua tuas asas e não tenha medo
quando começar a cair.

A terra chorará
seu sangue incessante
onde brotarão
as sujas rosas da salvação.

Clarice Shaw

Solar


Dentro do meu desejo
teu corpo intangível flutua...

Tuas palavras se dispersam em sonho perdido.

Do fogo dos teus olhos
crepitam instabilidades latentes.
E eu, em cinzas
reconstruo nova forma
feita da matéria antiga
que jamais perecerá.

Clarice Shaw

O Anjo e a Trapezista sob o Céu de Berlim


E se não fosse possível voar?

E se eu desafiasse a gravidade
do teu corpo?

E se você caísse
dentro do meu sentimento?

E se você pudesse me tocar?

E se eu passasse a girar
em torno de ti?

E se você me emprestasse
as tuas asas?

E se eu fosse você?
E se você não fosse eu?

E se houvesse um salto
que despertasse o leste
por todos os lados?

E se houvessem dois sóis?

E se as cores surgissem
depois que você me desse a mão?

E se, transpondo o muro,
pudéssemos seguir o tempo?

E se, da eternidade,
encontrássemos espaço para dor?

Clarice Shaw

Olhos Escuros

Abra teus olhos no escuro
e deixe ele te contemplar.
Abra teus olhos escuros,
abra teus olhos de escuridão...

Você não pode se mexer,
você já pode se perder,
você pode parar de respirar,
você pode desistir agora.

Abra teus olhos
porque as sombras te desejam.
Abra teus olhos
e contemple teus medos de perto

... desperta.

Clarice Shaw

terça-feira, 14 de maio de 2013

Para o dia das mães /2013

Ser mãe é gastar energia e tempo fazendo faxina numa casa para em meia hora ver tudo de pernas pro ar novamente (e ainda ter que escutar alguém reclamando do que não fez). Ter amor e paciência para fazer uma refeição e ainda ter seu trabalho substituído por um quitute de uma lanchonete qualquer. É ser força para sustentar os lamentos de todos em casa e guardar para si suas próprias angústias. E ainda assim, se inventar de querer trabalhar fora ou estudar, ainda ter que escutar coisas do tipo: “Você nunca ouviu falar de anticoncepcionais? Ser mãe foi opção sua, se vire”. Ser força de trabalho para sustentar a sociedade é importante, mas quem cuidará das pessoas até a idade de serem “economicamente ativos”?
Que o dia das mães não seja só hoje, mas todo dia, e vamos dar mais valor a quem sempre cuida da gente apesar de estar sociedade que só cultua valores androcêntricos.

Clarice Shaw

Maternidade

Eu precisei colher toda força que eu não tinha para poder te abraçar. E você me aceitou, como se tal força fosse suficiente. Eu te entreguei meu corpo para que você pudesse se nutrir. Eu virei minha alma pelo avesso para poder te acalentar.

Você me deu a mão, como se eu fosse sólida.

Você acompanhou meus passos, como se eu conhecesse o caminho.

Você me sorriu como se o meu coração pudesse acolher tua imensidão...

... e ele transbordou.

Teu pequenino corpo ainda cabe inteiro dentro dos meus braços. As asas do teu destino ainda estão em minhas mãos. Qualquer toque em falso e ela pode se quebrar. Teus olhos são dois sóis ardentes de vida. Neles se sustentam nosso amanhecer. Por eles me concentro no nosso futuro. Por eles me sustento para não cair. O único poder que disponho em abundância para lhe preservar é o Amor. Só ele me guiará até a melhor escolha. Só ele poderá minimizar os danos que meus erros podem lhe causar.

Clarice Shaw
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